Sob quarentena, o ovo em São Paulo tem venda forte e lucro ajustado

Sob quarentena, o ovo em São Paulo tem venda forte e lucro ajustado

Avicultores ouvidos pela A Hora do Ovo se disseram surpreendidos com a alta procura pelo ovo no início da quarentena; e avaliam a conjuntura do mercado atual.

POLOS DO OVO

abril 14, 2020

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A avicultura não para com a chegada do coronavírus. O mercado do ovo segue firme com a crise gerada pela entrada no Brasil dessa pandemia e suas consequências, como a decretação de distanciamento social em todos os estados - com fechamento de empresas que prestam serviços não essenciais – e apelo à população que permaneça em suas casas. 

No mercado paulista, segundo A Hora do Ovo apurou, a procura pelo ovo teve uma forte alta após o que popularmente se convencionou chamar de “quarentena” no pós-Covid-19 (nome dado à doença provocada pelo novo coronavírus, conforme convenção internacional).

A Hora do Ovo ouviu produtores das regiões de Bastos, Guatapará, Guarantã e Presidente Prudente, todas no Estado de São Paulo. Ouviu também Francisco Oura, da Cooperativa Avícola de Bastos, expert em mercado de postura e responsável pelo site www.ovoonline.com.br.

A conclusão é que a demanda por ovos se elevou a patamares muito superiores às expectativas. Sem termos vivido uma experiência similar como essa – população confinada e com medo de desabastecimento de alimentos – os avicultores foram surpreendidos com a alta procura pelo ovo, que rapidamente sumiu das gôndolas dos supermercados nos primeiros dias da quarentena. Inteligentemente, na hora de optar por uma proteína para estocar, o consumidor escolheu o ovo, produto nutritivo, versátil, saboroso e barato.

Não fosse o fato de tudo isso acontecer no mesmo momento em que o dólar também subiu a patamares recordes – elevando o preço dos insumos e encarecendo a produção do ovo - esse seria o momento perfeito do avicultor capitalizar-se. De qualquer forma, eles já ficaram muito aliviados em venderem muito bem, quase não terem dado conta da demanda no começo da quarentena e, principalmente, não terem seu produto encalhado, como aconteceu com outros empresários rurais, como os produtores de flores ou de frutas para exportação, com sérios riscos de sobrevivência.

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Tinoco: surpresa no mercado


O avicultor Rômulo Tinoco, da Granja Tinoco, de Guarantã (SP), disse que foi surpreendido pela expressiva procura pelo ovo. “Quando o consumidor entrou em quarentena começou a ter falta de ovo no mercado”, disse ele, admitindo que - num primeiro momento - ficou com medo que fosse o contrário, ou seja, que a granja tivesse dificuldade em vender seu produto durante esse período: “Nós produtores achávamos que na segunda semana de quarentena ninguém iria querer mais o produto; mas foi aí que teve falta de ovo no mercado”, salienta. E aí, conclui, “explodiu o preço do ovo”.

O avicultor Tiago Wakiyama, da Granja Mombuca, de Guatapará, na região de Ribeirão Preto, aponta que, antes mesmo da explosão da crise da Covid-19, o mercado já andava com o abastecimento justo e o preço em alta devido a vários fatores. Entre eles, explicou Wakiyama, os insumos – como milho e farelo de soja muito caros, o que elevou o custo de produção, enxugando, consequentemente, a produção. Mas admite que com o estabelecimento da quarentena e a surpreendente demanda pelo ovo houve momentos em que foi necessário comercializar a produção de forma escalonada, não podendo atender a todos os clientes de uma só vez, num primeiro momento.

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Wakiyama: equilíbrio entre oferta e procura


“Nós já esperávamos aumento da procura pelo produto devido à Quaresma, como é o habitual, mas houve uma procura muito acima do normal que surpreendeu a todos os produtores de ovos”, conta Tiago Wakiyama. Nem por isso, ele acredita que seja o momento de aumentar a produção de ovos na granja. “Em linhas gerais o Brasil já está chegando numa linha equilibrada entre oferta e demanda. É melhor manter isso ajustado”. Ele aponta que há hoje uma certa de falta de ovos vermelhos no mercado, mas acredita que seja uma questão de tempo para se alcançar o equilíbrio nesse nicho de mercado.

Da Região Oeste do Estado, ouvimos o produtor Gilson Yida, da Granja Acampamento, de Regente Feijó. Ele conta que, logo que foi anunciado pelo governo paulista o isolamento social e liberdade apenas para o comércio de itens essenciais ficar aberto, ficou assustado com o número de clientes cancelando compras. “Na segunda e terça-feira depois do anúncio, todos os feirantes que compravam da nossa granja cancelaram as compras, assim como os distribuidores que entregam para os restaurantes na capital. Foram muitas cargas canceladas. Passada essa fase, aí veio outra surpresa, com os supermercados fazendo compras sem parar. Ficamos as três primeiras semanas da quarentena vendendo para os supermercados muito acima do normal, às vezes com dois a três pedidos por dia para que eles pudessem atender à demanda dos consumidores”, conta.

Gilson disse que atualmente a venda está firme, mas já não está na mesma proporção; ainda assim, faltam ovos para atender a todos os pedidos. “Nas primeiras semanas da quarentena nós tivemos que fazer um escalonamento para não deixar de atender a todos os clientes. Houve momentos em que tivemos que entregar cerca de 30% dos pedidos aos clientes, mas não deixamos de atendê-los. Hoje ainda não entregamos carga completa, mas reduzimos somente cerca de 10% do total do que nosso cliente pede”, explica, Gilson.

Essa forma de escalonar as cargas - reduzindo um pouco para todos para que todos recebam – foi uma maneira encontrada de atender a todos os compradores e garantir o abastecimento. E tem dado certo, porque na ponta final – nas gôndolas dos supermercados, nas mercearias ou feiras – não tem faltado o produto, ainda que o preço tenha ficado inevitavelmente maior.

A Granja Acampamento tomou uma série de precauções devido à pandemia, como medição da temperatura dos funcionários na chegada na granja, remanejamento de seu pessoal na hora do almoço, que agora é em três turnos; todos os carros que entram em qualquer ponto da propriedade são desinfectados (e não somente na área da produção, como é obrigatório), o pessoal do depósito de ovos usam máscaras, a limpeza das áreas de maior concentração de pessoas são higienizadas mais vezes ao dia, além das medidas de home office ou férias para as pessoas com idade acima de 60 anos ou com alguma condição física que a torna mais vulnerável à contaminação pelo novo coronavírus.

Empresa tradicional da região de Presidente Prudente, a Granja Acampamento vai manter seu planejamento de ampliação até 2022. Ainda este ano tem a previsão de novos alojamentos e agora a única preocupação é se os equipamentos chegarão a tempo, já que o impacto da crise da Covid-19 deve-se fazer sentir também no planejamento das fábricas de aviários.

GILSON
Yida: alto custo dos insumos


Otimista, acredita que mesmo com a crise econômica inevitável que a pandemia provocará no país e no mundo, o mercado do ovo seguirá firme. Ainda que os custos de produção estejam muito altos. “São quatro os fatores que nos prejudicam no momento: o alto custo do milho, do farelo de soja, do farelo de carne e dos aminoácidos, vitaminas e minerais. Esses insumos subiram muito, o que prejudica fortemente a lucratividade. Então, mesmo com a venda do ovo em alta, nós sabemos que nossa margem de lucro não está no patamar que estava antes, e nem como muitos que estão fora do mercado estão imaginando”, alerta.

A Hora do Ovo ouviu também o avicultor e médico veterinário Sérgio Kenji Kakimoto, da Granja Kakimoto, que está no centro de ovos altamente produtivo do Estado de São Paulo, o município de Bastos, conhecido desde os anos 1960 como Capital do Ovo. Esse pequeno e produtivo território paulista é importante para o mercado porque baliza há anos o preço do ovo. É que ao menos 50% dos ovos que abastecem São Paulo e 20% que abastecem o Brasil saem de suas granjas – e das granjas de sua microrregião, o Bolsão de Bastos, como Ministério da Agricultura batizou a região de 16 municípios que formam essa área geoeconômica. 

Sérgio Kakimoto confirmou que aumentou a procura por ovos após a determinação do distanciamento social e gerou muita especulação de preços. Mas isso não significa, segundo ele, que os ganhos do avicultor tenham crescido, já que a procura maior pelo ovo aconteceu num momento em que os custos de produção estão muito altos. “Todos os premixes que usamos são dolarizados e o dólar está num patamar muito alto, assim como o milho e o farelo de soja. Em setembro de 2019 o milho estava em R$33,00 a saca; no final do ano chegou a R$39,00, e agora, durante o estouro da crise da Covid-19, chegou ao patamar de R$63,00 a saca, um preço altíssimo. Assim como a tonelada do farelo de soja que estava cotado a R$1.300,00 a tonelada e passou a R$1.800,00. Fazendo uma análise, considero que os insumos que usamos chegaram a uma alta de até 40% em alguns momentos, enquanto o preço do ovo subiu de 30 a 35%. E é essa alta do ovo que está nos permitindo sobreviver; mas está difícil também para nós”, reclama Sérgio Kakimoto.

SERGIO-KAKIMOTO
Kakimoto: está difícil também para o avicultor

Ele alerta que há uma especulação no mercado de que o produtor de ovo está ganhando muito dinheiro diante do aumento da demanda, mas a realidade não é bem essa: “Temos muitos compradores que vendem para o governo estadual e prefeituras e agora estão jogando o pagamento para meses à frente porque a merenda escolar foi interrompida”, cita como exemplo de prejuízo aos produtores. Mas admite que diante de outros segmentos do agronegócio o ovo está num patamar mais confortável: “Tenho contato com produtores de frutas e verduras em grandes centros paulistas que estão com prejuízos enormes. Principalmente os que produzem frutas para exportação”, conta Kakimoto.

Ele aponta que a granja de sua família tem uma vantagem que é adotar uma estratégia de pulverizar sua venda. Ou seja, não fica dependente de poucos pontos de entrega de sua produção diária: “Nossa venda é pulverizada e isso, de certa forma, nos protegeu nesse momento”. Ele acredita que enquanto durar a quarentena a procura pelo ovo deve continuar forte, já que o ovo é um produto versátil na alimentação, barato e nutritivo, e também fácil de armazenar em casa. Mas não vê risco de desabastecimento do produto.

“Como viemos nos últimos meses com uma baixa na produção devido a descartes de aves, a tendência agora é o produtor repor seus planteis e aproveitar a alta da demanda, mas isso leva tempo”, lembra, ressaltando que, mesmo quem aloje pintainhas agora, demorará quatro meses para ter suas aves botando os primeiros ovos. “Esse período em que aumenta a demanda e a oferta do produto é menor é o período em que o produtor tem para aumentar sua rentabilidade, mas acredito que o mercado deva entrar num equilíbrio”, pontua.

Segundo A Hora do Ovo apurou com algumas de suas fontes, muitos produtores já haviam planejado ampliar seus planteis antes mesmo da explosão da crise da Covid-19. Alguns produtores – e não só na região de Bastos – estão com novos galpões prontos para alojar e outros fizeram descartes de aves um pouco acima do normal neste começo de ano devido a questões diversas, desde alta expressiva dos insumos até imprevistos sanitários e instabilidades econômicas. Agora o que se espera é que o produtor, com sua experiência, saiba avaliar o timing de alojar para ajustar o mercado no ponto certo, o que é sempre algo de difícil acerto.

FRANCISCO-OURA
Oura: preços estabilizados

Francisco Oura, gerente da Cooperativa Avícola de Bastos e fundador do site www.ovoonline.com.br – referência no preço do ovo no Brasil, aponta que são muitos os fatores a serem levados em conta para entender o mercado do ovo e fazer projeções. Nas duas últimas semanas em que A Hora do Ovo têm feito contato com ele, o preço do ovo branco extra  tem se mantido em R$117,00 para retirar na granja em Bastos (a caixa do ovo vermelho fica em R$20,00 a mais, segundo ele) e assim deve permanecer em abril.

No informe do Ovo On Line do dia 13 de abril, a informação logo de manhã era: “Depois da Semana Santa e pagamento de salário, o mercado de ovos inicia esta semana ainda com as ofertas ajustadíssimas e preços estabilizados. A expectativa é de que este cenário seja mantido para as próximas semanas”.

De qualquer forma, Oura disse a A Hora do Ovo que é importante estar atento ao mercado de da carne de frango e suas questões logísticas de exportação para antever possíveis variações no mercado o ovo in natura. 

OS NÚMEROS DO CEPEA

Segundo dados do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada), da Esalq/USP, neste começo de abril, os ovos são negociados em patamares recordes reais, considerando-se a série de preços do Centro de Pesquisas, iniciada em 2013 para esse produto (os valores foram deflacionados pelo IPCA de fevereiro).

Em Bastos (SP), a caixa de 30 dúzias de ovos brancos tipo extra foi cotada a R$116,85 em 8 de abril. O ovo vermelho foi negociado a R$137,85/cx, também no dia 8. Essas médias diárias são 14% e 15%, respectivamente, superiores às verificadas há um mês e 33,1% e 33,3% acima das observadas no mesmo dia de 2019 – dados do Cepea.

De acordo com pesquisadores do Cepea, além de o período de Quaresma já tradicionalmente aquecer a procura por ovos, a preocupação da população com uma possível falta de alimentos tem levado mercados atacadistas e varejistas a aumentarem seus pedidos de ovos. Alguns colaboradores do Cepea relatam que o número de pedidos tem superado a produção das granjas.

(A Hora do Ovo. Fotos: A Hora do Ovo e divulgação)

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